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Uma geração desbravadora

18/10/2020

Em 91, logo na primeira edição dos Jogos Pan-Americanos com disputa de conjuntos na GR, o Brasil faturou a prata, graças a uma seleção que treinava até de madrugada

Uma geração desbravadora

Fidel Castro era famoso pelos longos discursos. Entrou para o livro dos recordes, o Guiness, ao ocupar o púlpito da ONU por 4 horas e 29 minutos. Mas essa não foi a maior marca pessoal dele – em 1986, durante o 3º Congresso do Partido Comunista Cubano, falou por 7 horas e 10 minutos. Na abertura dos Jogos Pan-Americanos de Havana, no entanto, deu uma declaração expressa: “Distintos convidados, atletas e compatriotas: eu declaro abertos os décimos-primeiros Jogos Pan-Americanos. Obrigado”. Pronto! Estava inaugurado o Pan de Havana, competição que entrou para a história do esporte brasileiro por várias razões.

A bandeira da Organização Desportiva Pan-Americana, a Odepa (atual Pan Am Sports) foi entregue ao excepcional pugilista Téofilo Stevenson; Javier Sotomayor, que detém o recorde mundial do salto em altura até hoje, acendeu a pira, e a meio-fundista Ana Quirot, dona de três medalhas olímpicas, proferiu o juramento.

Longe dali, estava um grupo de seis batalhadoras componentes da Seleção Brasileira de Conjunto de Ginástica Rítmica. Elas não participaram da abertura do Pan, tampouco do encerramento. A final concorreu com a decisão da medalha de ouro do vôlei masculino. Preocupadas em exibir a turma de Maurício, Marcelo Negrão, Tande e Giovane, que haveriam de se sagrar campeões olímpicos no ano seguinte, as emissoras deixaram de mostrar uma história de enorme significado para a nossa GR: a da conquista da medalha de prata logo na primeira edição dos Jogos Pan-Americanos com disputa de conjuntos.  

A história da longa luta por essa medalha começa em 1978. A bailarina Yara Zamberlan já tinha experiência como atleta de Ginástica Rítmica Desportiva – representando a equipe do Colégio Americano de Porto Alegre, destacou-se em eventos como os Jogos Escolares Brasileiros. O desempenho chamou a atenção de Léo Terra, então diretor do Departamento de Ginástica Olímpica do Grêmio Náutico União, que a convidou, naquele ano, para abrir uma escolinha de GR. Como os sócios desconheciam a modalidade, Yara ficou seis meses sem ter uma aluna sequer. Mas o clube insistiu, e elas começaram a chegar.

“As meninas vieram muito cruas. Começamos as atividades, iniciamos a parte de manejo de aparelhos. Aí fomos disputando campeonatos estaduais, brasileiros; a turma chegou ao nível internacional”, diz Yara, que foi treinadora no GNU por 30 intensos anos, como ela adjetiva.

Nesse itinerário, percorrido com muito suor, renúncia e inspiração, aquele grupo não fraquejou. Com a nota 35.550 na final da disputa de conjuntos do Pan de 91, obteve a prata, superando, por muito pouco, as canadenses, que registraram 35.350.  O ouro coube a Cuba – 36.250.

A medalha no Pan não foi a única conquista expressiva daquele grupo. Naquele tempo ainda não havia Centro de Treinamento de GR nem seleção permanente. Assim, os clubes disputavam nos Campeonatos Brasileiros o direito de representar o País nas competições internacionais. Por cerca de dez anos, o Grêmio Náutico União conquistou o Troféu Eficiência, conferido pela Confederação Brasileira de Ginástica ao clube ou associação detentora da maior pontuação, somadas as diversas categorias, do mirim ao adulto.

O grupo foi formado por Alessandra Seligman, Bibiana Castro, Débora Morais, Gabriela Baal e Valquíria Rosário - todas do Grêmio Náutico União - e por Alessandra Frederico, da equipe Tampax, de São Paulo.

Dois anos antes, uma outra Seleção, também com predominância de atletas do GNU, representou o Brasil no Mundial de Saravejo, em 1989. Bibiana e Débora já faziam parte, bem como Fernanda Sibemberg, que foi a Havana para as disputas individuais. As outras integrantes eram Andrea Frederico (irmã gêmea de Alessandra), Gabriela Poisl e Daniela Scherer. As reservas eram Tatiane Bernardes e Lenise Moreno.

A Bósnia e Herzegovina, cuja capital é Saravejo, ainda integrava a República Socialista Federativa da Iugoslávia. Naquela competição, o Brasil obteve a 14ª posição – a melhor desde a edição de Madri/1975. O Mundial disputado na Espanha fora moldado em outro formato, com 11 conjuntos, e o Brasil ficara em sétimo – avançaram os seis melhores para a final.

O desempenho em Saravejo empolgou a direção do GNU, as garotas e seus pais – que exerciam também a função de “paitrocinadores”. No ano seguinte, 1990, o grupo viajou para se preparar em Kiev, na Ucrânia. Lá treinaram intensamente – e o esforço foi recompensado. “Voltamos numa forma física e técnica incrível da Ucrânia”, diz Bibiana Castro. “Estávamos melhores no manejo dos aparelhos, com mais velocidade e impulsão”.

O esporte cuja escolinha havia ficado às moscas por seis meses ganhou notoriedade no União. “A GR tomou um impulso muito forte no clube. Os pais foram conhecendo. Quando chegava o fim do ano, fazíamos uma festa com apresentação das gurias – uma espécie de Ginástica de Gala. Era algo muito bacana, com distribuição de premiações, de presentes de Natal. O ginásio ficava lotado”, recorda Yara.

Assim, foi nesse embalo, com esse entusiasmo, que a seleção brasileira de conjunto embarcou para Havana. As provas de Ginástica Rítmica, assim como as da Ginástica Artística, foram realizadas em Santiago de Cuba, segunda cidade mais importante do país, situada na costa sul.

A equipe cubana também treinou duro, ambicionando o topo do pódio. O objetivo da ilha de Fidel era desbancar os Estados Unidos no quadro geral de medalhas – e foi alcançado. No mesmo Mundial de Saravejo, em que o Brasil havia obtido o bom 14º lugar, Cuba tinha ficado em 13º. O Canadá se posicionou em 19º, e os Estados Unidos, em 12º.

Situado num dos bairros mais populosos de Santiago de Cuba, o Distrito José Martí, o palco da Ginástica em Havana foi o Palacio del Deporte Santiaguero – ou Sala Polivalente Alejandro Urgellés – que tem cinco mil lugares e hoje recebe muitas lutas de boxe, paixão nacional. As imagens feitas por familiares das atletas mostram placas de publicidade que nos remetem a marcas da época: Gradiente, Panelas Clock, Ford Versailles, Samello, e um produto local: TropiCola, o refrigerante oficial do Pan de 91.

“Lembro que o ginásio estava lotado, e o povo gritava muito, todo animado. Cuba tinha uma equipe realmente boa, com um sincronismo incrível. Lembro que suava muito nas mãos, e sempre carregava uma toalhinha pra enxugar. Felizmente, a gente conseguiu fazer uma apresentação muito boa também”, recorda Alessandra Seligman.

Domando o nervosismo - o que é primordial numa modalidade em que um erro na tentativa de apanhar um aparelho pode ser fatal – o Brasil conseguiu, ao som da bela “Rapsódia Húngara”, fazer apresentação “excelente”, na avaliação de Yara. “Ao final da nossa série, senti uma satisfação muito grande”. Muito educado e com espírito esportivo, o público cubano aplaudiu, com generosidade, os momentos mais impactantes proporcionados pelas brasileiras.

Débora Morais sentiu que a medalha de prata do Pan de 91, que é histórica, fez valer a pena todo o esforço – que não foi pouco. “O ginasião do União era muito disputado por várias modalidades – o vôlei, o basquete, etc. Era o único com altura suficiente para podermos lançar os aparelhos despreocupadas. Os outros tinham um teto mais baixo, e eles engatavam em arames, lonas, telhas. Por esse motivo, várias vezes fomos treinar à noite, num horário em que não tinha nenhum outro esporte usando o ginásio grande. Adentrávamos a madrugada, até umas 2h da manhã”.

“Eram gurias que trabalhavam como loucas. Às vezes alguma chegava meia hora antes do horário, e já aproveitava para treinar o manejo de um aparelho. Formamos uma equipe boa, dedicada. Quebraram barreiras com garra”, diz Leila Costa, auxiliar de Yara. Árbitra internacional, com participação em Mundiais, exercia um papel fundamental na montagem de coreografias, por exemplo, por ter amplo conhecimento do Código de Pontuação. Com idade mais próxima das atletas, também as orientava com o intuito de fortalecê-las mentalmente.

As peças prateadas que vieram da maior ilha do Caribe têm um significado amplo, na opinião de Débora. “A gente contribuiu pra tirar a GR do anonimato. Dentro de nós, sentimos que seria a primeira medalha de muitas. Abrimos as portas para a GR brasileira”.

A campanha em Cuba foi uma das etapas da epopeia das gurias, que se dedicaram muito na luta por uma vaga nos Jogos Olímpicos de Barcelona-92, os primeiros com disputa de conjuntos. O 14º lugar na edição de Saravejo as entusiasmou – se evoluíssem e alcançassem o top 10 n Mundial, em outubro daquele mesmo ano, em Pireu, na Grécia, realizariam o sonho.

As ginastas e suas famílias se esfalfaram para obter uma verba de CR$ 10 milhões. “Vendemos rifas, galetos, brigadeiros e fizemos até uma exibição na Rua da Praia, passando o chapéu. Conseguimos também um patrocínio das motoserras Stihl. No final, o grupo conseguiu ir à Grécia”, lembra Leila.

Na fase classificatória, alguns erros foram fatais, e o Brasil obteve uma classificação muito aquém de suas verdadeiras possibilidades – a 27ª. Para se ter uma ideia, o Canadá, batido em Havana, foi o 11º - a apenas uma posição da vaga olímpica. A composição da Seleção fora alterada: Andrea Frederico, que fora ao Mundial de 89, retornou; Alessandra Frederico, Alessandra Seligman, Bibiana, Débora e Valquíria permaneceram, e Fernanda Sibemberg, que representara o País individualmente, foi adicionada ao conjunto, bem como Natália Gardini.

De qualquer forma, segundo Leila, todas as integrantes daquele grupo hoje olham aqueles anos de muita luta com grande orgulho. “Aquelas meninas superaram muitos desafios e escreveram um capítulo muito bonito na história do esporte no Brasil”. 

Foto: Atrás, Alessandra Seligman, Debora Morais, Bibiana Castro , 
Na frente: Alessandra Frederico, Yara Zamberlan( técnica) 
Valquiria Rosario e Gabriela Baal
Crédito: Arquivo Pessoal/Alessandra Seligman   

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